Pagamento Antecipado - Requisitos - Garantias - TCU
2. A falta de exigência específica e suficiente, na forma de seguros ou garantias, para autorização de antecipações de pagamento previstas contratualmente afronta o disposto no art. 38 do Decreto 93.872/1986; nos arts. 40, inciso XIV, alínea d, e 65, inciso II, alínea c, da Lei 8.666/1993; e nos arts. 31, § 1º, inciso II, alínea d, e 81, inciso V, da Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais).
O
TCU realizou auditoria de conformidade (Fiscobras 2018) nas obras de ampliação
da Usina Termelétrica (UTE) Santa Cruz, no município do Rio de Janeiro/RJ, de
responsabilidade da empresa Furnas Centrais Elétricas S.A, com o objetivo de
examinar a legalidade do processo de contratação do consórcio formado pelas
[empresas 1 e 2] para execução, por empreitada integral, dos serviços e obras
referentes à implantação do ciclo combinado da UTE Santa Cruz. A partir dos
procedimentos de auditoria, a equipe identificou, entres outros, o seguinte
achado: adiantamento de pagamento sem a apresentação das garantias contratuais.
De fato, por meio de análise da planilha contratual de eventos e pagamentos
descritivos dos itens de preços, a equipe de auditoria “identificou [...] a previsão
de antecipação de pagamentos associada à ausência de disposição contratual
quanto a cautelas ou garantias específicas para tais antecipações”. Segundo
o relator do processo, a SeinfraElétrica, unidade técnica responsável pela
instrução do feito, defendeu inicialmente que ocorrera antecipação de
pagamentos, contrariando “o disposto no
art. 65, inciso II, da Lei 8.666/1993, bem como nos arts. 62 e 63 da Lei
4.320/1964”. A unidade técnica também apontou que “não se observou a adoção de precauções por parte de Furnas no sentido
de se cercar de garantias mínimas suficientes para suportar eventual prejuízo,
contrariamente ao disposto no art. 38 do Decreto 93.872, de 23 de dezembro de
1986, e à jurisprudência desta Corte”. Em sua derradeira análise
instrutória, após oitivas dos responsáveis, a SeinfraElétrica concluiu que, de
fato, houvera antecipação de pagamento; defendeu, contudo, que “(i) é razoável a realização das referidas
antecipações, constituindo prática de mercado para garantir o início da
fabricação dos equipamentos, (ii) Furnas deveria ter se cercado de garantias
específicas, as quais não poderiam ser substituídas por aquelas previstas no
art. 56 da Lei 8.666/1993, embora (iii) tenha havido perda de objeto da
referida irregularidade em razão do início do processo de entrega efetiva”.
Sobre a viabilidade jurídica da antecipação de pagamentos, o relator ressaltou
que “a partir dos Acórdãos 2.262/2011 e 1.879/2011, Relator Ministro Augusto Nardes, ambos
do Plenário, [...] é possível perceber que esta Corte vinha se
escorando nos parâmetros conditos no art. 65, inciso II, da Lei 8.666/1993, no
art. 38 do Decreto 93.872/1986 ou nos artigos 62 e 63 da Lei 4.320/1964,
inclusive para as empresas estatais”. Ainda sobre o aspecto jurídico, o
relator destacou que a Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais) “também aponta para a impossibilidade de antecipação do pagamento,
consoante indica o inciso V de seu art. 81”. Aduziu, também, que “esta Corte tem admitido, em hipóteses
excepcionais, a realização dos adiantamentos, consignando em sua jurisprudência
a existência de três pressupostos cumulativos, a exemplo do Acórdão 4.143/2016-1ª Câmara, Relator
Ministro Benjamin Zymler (trecho do Voto condutor): ‘[...] são três
os requisitos exigidos para a realização dos pagamentos antecipados: i)
previsão no ato convocatório; ii) existência, no processo licitatório, de
estudo fundamentado comprovando a real necessidade e economicidade da medida; e
iii) estabelecimento de garantias específicas e suficientes, que resguardem a
Administração dos riscos inerentes à operação’”. Ao apreciar o caso
concreto em tela, o relator foi ao encontro da análise da SeinfraElétrica e
reconheceu a razoabilidade da antecipação de pagamentos, “dada a complexidade do fornecimento e a constituição de prática de
mercado para garantir o início da fabricação dos equipamentos”. Segundo
ele, “no presente caso, as análises
técnicas não deixam dúvidas de que, tomando-se por base o objeto contratado, em
si, e o respectivo processo produtivo, o instrumento contratual permite
pagamentos atrelados a etapas preliminares à efetiva entrega efetiva dos bens”.
Contudo, apesar de reconhecer “a
plausibilidade jurídica para as referidas antecipações”, destacou a não “adoção de cautelas adicionais por parte de
Furnas, com vistas ao resguardo do erário”. Assim, o relator defendeu que o
adiantamento, admitido em caráter excepcional, ocorrera “sem a exigência de garantia específica mitigadora dos riscos de não
execução integral do empreendimento e consequente prejuízo ao erário”.
Entretanto, absteve-se de propor determinação à entidade jurisdicionada para
inserir no contrato cláusula de garantia específica quanto ao adiantamento “ante o início do processo de entrega efetiva
dos equipamentos e a proximidade da conclusão das obras, no caso em epígrafe,
associados à noticiada inserção de cláusula padrão”. Por fim, propôs, e o
Plenário acolheu, expedição de ciência a Furnas sobre o ponto, nos seguintes
termos: “a falta de exigência específica
e suficiente, na forma de seguros ou garantias, para a autorização de
antecipações de pagamentos previstas no Contrato 8000010144, afronta ao
disposto no art. 38 do Decreto 93.872/1986; a alínea ‘d’ do inciso XIV do art.
40 e a alínea ‘c’ do inciso II do art. 65 da Lei 8.666/1993; alínea ‘d’ do
inciso II do § 1º do art. 31 e inciso V do art. 81 da Lei 13.303/2016; e a
jurisprudência do TCU, com vistas à adoção de providências internas que
previnam a ocorrência de outras irregularidades semelhantes (Achado III.3)”.
Acórdão
3233/2020 Plenário, Auditoria, Relator Ministro-Substituto Augusto
Sherman.
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