Participação de associações civis sem fins lucrativos em licitações - TCU
2. A participação de associações civis
sem fins lucrativos em licitações somente é admitida quando o objeto da avença
estiver em conformidade com os objetivos estatutários específicos da entidade.
Em
processo de representação formulada ao TCU, questionou-se a possibilidade
jurídica da participação em pregão eletrônico – promovido pela 1ª Circunscrição
Judiciária Militar visando à contratação de serviços continuados de apoio
administrativo – de associação civil sem fins lucrativos, que fora vencedora e
habilitada do certame. O questionamento teve por base o conteúdo do art. 53, caput, do Código Civil, segundo o qual
as associações são constituídas “pela união
de pessoas que se organizem para fins não econômicos”. Tanto a unidade
técnica quanto o Ministério Público de Contas concluíram pela procedência
parcial da representação, sob o argumento de que o mencionado dispositivo não
proíbe incondicionalmente a participação de entidades civis sem fins lucrativos
em licitações, mas sua contratação pelo Poder Público somente é admitida quando
o objeto da avença estiver em conformidade com os objetivos estatutários
específicos da contratada, conforme a jurisprudência do TCU. Em seu voto, o
relator destacou que, de fato, não se deve conferir interpretação literal e
restritiva à expressão “para fins não
econômicos” contida no art. 53 do Código Civil, haja vista que o art. 54,
inciso IV, do mesmo código dispõe que o estatuto das associações deverá
obrigatoriamente indicar “as fontes de
recursos para sua manutenção”. Além disso, continuou o relator, a Lei
8.666/1993, em seu art. 24, inciso XX, permite a contratação direta, por
dispensa de licitação, “de associação de
portadores de deficiência física, sem fins lucrativos e de comprovada
idoneidade, por órgãos ou entidades da Administração Pública, para a prestação
de serviços ou fornecimento de mão-de-obra, desde que o preço contratado seja
compatível com o praticado no mercado”, donde concluiu que “as disposições do art. 53 do Código Civil
não vedam a que Administração Pública contrate associação civil sem fins
lucrativos”. O relator ponderou, no entanto, que, se as normas de regência
e a jurisprudência do TCU exigem que o objeto do contrato administrativo,
nesses casos, não implique desvio de finalidade da associação sem fins
lucrativos, “é logicamente certo que o
estatuto da contratada deva ter objetivos específicos, que lhe confiram uma
identidade institucional, uma singularidade de propósitos, condição sine qua
non para que se estabeleça, com razoável precisão, o nexo que se exige entre
objetivos institucionais e objeto contratual.”. Retomando o caso concreto,
o condutor do processo deixou assente que as disposições estatutárias da
associação em tela, embora invocadas por esta e pelo órgão fiscalizado como
fundamento para a contratação questionada, “possuem
conteúdo demasiadamente aberto, o que, em tese, permitiria adequar sua
finalidade institucional a praticamente qualquer objeto de terceirização de
serviços pretendidos pela Administração”, tornando assim inócua a exigência
de nexo específico entre o objetivo institucional da associação civil e o
objeto do contrato administrativo. Ressaltou ainda que esse nexo específico é
necessário para estabelecer um “discrimen
mínimo entre as associações sem fins lucrativos e as sociedades empresariais,
em relação às possibilidades de contratação com a Administração Pública”.
Do contrário, “estar-se-iam criando
condições não isonômicas entre ambas as espécies de licitantes, pois os
primeiros, com menor carga tributária, ingressariam em uma ampla gama de
certames em condições privilegiadas em relação aos últimos”. Nos termos da
proposta do relator, “tendo em vista que
os objetivos genéricos consignados no estatuto da associação não permitem
estabelecer o necessário e preciso vínculo com o objeto da contratação, sob
pena de desvio de finalidade da referida associação civil sem fins lucrativos”,
o Plenário decidiu considerar parcialmente procedente a representação e fixar
prazo para que o órgão “anule o ato
administrativo que habilitou irregularmente a associação no aludido pregão, bem
como os demais atos dele porventura decorrentes”.
Acórdão
2847/2019 Plenário, Representação, Relator Ministro Raimundo Carreiro.
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