Responsabilidade. Culpa. Erro grosseiro. Sanção. Requisito - TCU
Acórdão
11762/2018 Segunda Câmara (Embargos de Declaração, Relator Ministro-Substituto Marcos
Bemquerer)
Responsabilidade. Culpa. Erro
grosseiro. Sanção. Requisito.
Para fins de aplicação de sanções
administrativas pelo TCU, há que se verificar a ocorrência de culpa grave ou
dolo do administrador público.
(...)
13. Esse tema foi recentemente tratado nos autos do TC-007.416/2013-0, em que o Relator, Ministro Benjamin Zymler, interpretou com maestria os dispositivos da novel Lei 13.655/2018, informalmente chamada de “lei da segurança jurídica”. Esse diploma incluiu novos enunciados na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) .
14. Para melhor compreensão da matéria, reproduzo trecho do Voto de Sua Excelência, que impulsionou o Acórdão 2.391/2018 – Plenário (grifos do original) :
“79. Quanto à alegação de que não existem indícios de que o defendente tenha agido dolosamente, destaco que a responsabilidade dos jurisdicionados perante o TCU é de natureza subjetiva, caracterizada mediante a presença de simples culpa stricto sensu, sendo desnecessária a caracterização de conduta dolosa ou má-fé do gestor para que este seja instado a ressarcir os prejuízos que tenha causado ao erário (Acórdãos 9004/2018-1ª Câmara, 635/2017-Plenário, 2781/2016-Plenário, dentre outros) .
80. Neste ponto, cabe ressaltar que a Lei 13.655/2018 introduziu vários dispositivos na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB, que diretamente alcançam a atividade jurisdicional desta Corte de Contas, em especial a atividade de aplicação de sanções administrativas e de correção de atos irregulares.
81. Segundo os arts. 22 e 28 da LINDB, recém introduzidos pela referida norma:
‘Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.
§ 1º Em decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente.
§ 2º Na aplicação de sanções, serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para a administração pública, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes do agente.
§ 3º As sanções aplicadas ao agente serão levadas em conta na dosimetria das demais sanções de mesma natureza e relativas ao mesmo fato.
(...)
Art. 28. O agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.’
82. Dito isso, é preciso conceituar o que vem a ser erro grosseiro para o exercício do poder sancionatório desta Corte de Contas. Segundo o art. 138 do Código Civil, o erro, sem nenhum tipo de qualificação quanto à sua gravidade, é aquele ‘que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio’ (grifos acrescidos) . Se ele for substancial, nos termos do art. 139, torna anulável o negócio jurídico. Se não, pode ser convalidado.
83. Tomando como base esse parâmetro, o erro leve é o que somente seria percebido e, portanto, evitado por pessoa de diligência extraordinária, isto é, com grau de atenção acima do normal, consideradas as circunstâncias do negócio. O erro grosseiro, por sua vez, é o que poderia ser percebido por pessoa com diligência abaixo do normal, ou seja, que seria evitado por pessoa com nível de atenção aquém do ordinário, consideradas as circunstâncias do negócio. Dito de outra forma, o erro grosseiro é o que decorreu de uma grave inobservância de um dever de cuidado, isto é, que foi praticado com culpa grave.
Gradação do Erro
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Pessoa que seria capaz de perceber o erro
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Efeito sobre a validade do negócio jurídico (se substancial)
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Erro grosseiro
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Com diligência abaixo do normal
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Anulável
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Erro (sem qualificação)
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Com diligência normal
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Anulável
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Erro leve
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Com diligência extraordinária - acima do normal
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Não anulável
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84. Segundo Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, ‘culpa grave é caracterizada por uma conduta em que há uma imprudência ou imperícia extraordinária e inescusável, que consiste na omissão de um grau mínimo e elementar de diligência que todos observam’ (FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. São Paulo: Atlas, p. 169) .
85. Os aludidos autores invocaram a doutrina de Pontes de Miranda, segundo a qual a culpa grave é ‘a culpa crassa, magna, nímia, que tanto pode haver no ato positivo como no negativo, a culpa que denuncia descaso, temeridade, falta de cuidados indispensáveis’. (PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado, t. XXIII. Rio de Janeiro: Borsoi, 1971, p. 72) .
86. Tomando por base tais balizas, compreendo que os elementos acostados nos autos permitem concluir que o Sr. (...) agiu, no mínimo, com culpa grave na supervisão do Contrato 7/2006, pois, no alto de sua posição hierárquica, orientou os fiscais a atuarem em desacordo com os termos do contrato, possibilitando o uso dos veículos locados sem o mínimo de controle. Ademais, ele autorizou pagamentos sem as informações mínimas exigidas para a regular liquidação da despesa, o que possibilitou o recebimento pela empresa de valores muito acima do razoável e da média histórica da Funasa.
87. Dessa forma, julgo adequada a inclusão do ex-Cooordenador Geral de Logística no rol de responsáveis pelo débito e, diante da existência de culpa grave, a aplicação da multa do art. 57 da Lei 8.443/1992, no valor a ser especificado a seguir, conforme a análise a ser efetuada adiante. Ademais, julgo pertinente a inabilitação do responsável pelo período de cinco anos para o exercício de cargo em comissão ou função de confiança no âmbito da Administração Pública.”
147. O dever de indenizar os prejuízos ao erário permanece sujeito à comprovação de dolo ou culpa, sem qualquer gradação, como é de praxe no âmbito da responsabilidade aquiliana, inclusive para fins de regresso à administração pública, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição:
‘6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.’
148. Como regra, a legislação civil não faz nenhuma distinção entre os graus de culpa para fins de reparação do dano. Tenha o agente atuado com culpa grave, leve ou levíssima, existirá a obrigação de indenizar. A única exceção se dá quando houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano. Nesta hipótese, o juiz poderá reduzir, equitativamente, a indenização, nos termos do art. 944, parágrafo único, do Código Civil.”
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